Uma das máximas mais
difundidas no mundo dos negócios diz que o cliente tem sempre razão. A
legislação que dita os direitos dos consumidores e alguns entendimentos da
Justiça, no entanto, têm mostrado que essa afirmação nem sempre é verdadeira.
Exigir a troca de uma roupa só porque ela não serviu ou o presenteado não
gostou, por exemplo, é uma prática baseada num direito que não existe. O Código
de Defesa do Consumidor não obriga as lojas a fazerem a troca em casos assim.
"Na tentativa de fidelizar os clientes, comerciantes permitem a realização
da troca, mas como cortesia", diz o advogado especializado em direitos do
consumidor Alexandre Berthe.
Pela lei, a troca só é
obrigatória se o produto tiver algum defeito. Mesmo assim, o fabricante tem 30
dias para fazer o conserto do produto. Só depois que esse prazo chega ao fim é
que o consumidor pode exigir uma de três opções: a troca imediata, a devolução
do dinheiro ou o abatimento proporcional do valor pago (se o defeito não
impedir o produto de ser usado e o cliente desejar ficar com ele, ganha um
desconto no preço). Existem, porém, algumas exceções, diz a presidente da SOS
Consumidor, Marli Sampaio. Entre elas estão os casos de o produto ser
considerado essencial (como uma geladeira ou um carro usado como meio de
trabalho) ou de o defeito impossibilitar o seu uso (uma pane no motor que
impede o uso do carro, por exemplo). "Nesses casos, o consumidor não terá
que esperar 30 dias pelo conserto. Ele poderá exigir de imediato uma das três
opções", diz. Em caso de compras feitas por meio remoto (internet,
telefone ou venda direta, por exemplo), a regra também é diferente: o
consumidor pode desistir da compra em até sete dias, seja por que motivo for.
Justiça decide contra consumidor que quer obter vantagem Outro direito que
muitos consumidores têm pleiteado, mas a Justiça tem entendido que eles não
têm, é a compra de um produto por um preço irrisório. Em agosto, um juiz de São
Paulo negou o pedido de um consumidor que queria ter o direito de pagar R$ 0,01
por um carro. O cliente alegou que a loja anunciou veículos "a preço de
banana" e deveria cumprir o prometido. Para o juiz, o consumidor agiu de
má-fé. Decisões semelhantes têm sido tomadas quando lojas virtuais anunciam
produtos por preços muito baixos por causa de erros no sistema. "Nesses
casos, a Justiça tem usado o bom senso. Se um produto custa R$ 1.000 e é
anunciado por R$ 100, por exemplo, está claro que houve um erro. Quando o erro
é muito grotesco e o preço foge completamente ao padrão, fica evidente que o consumidor
quis tirar vantagem", diz Alexandre Berthe. Tribunais de todo o país
também têm decidido contra o consumidor no caso da cobrança da assinatura de
telefonia fixa. Apesar de essa tarifa ser amplamente contestada na Justiça e
ainda ser alvo de polêmica, o entendimento tem sido de que a cobrança é
correta, afirma Marli Sampaio. Compra de pessoa física não é relação de consumo
Da mesma forma, o consumidor não tem razão, dizem os especialistas, quando quer
usar o Código de Defesa do Consumidor para se defender de problemas de compras
feitas de pessoas físicas. Nesse caso, não se trata de uma relação de consumo.
Por isso, a lei que vale é o Código Civil, o que, na prática, faz com que seja
necessário o consumidor provar que sofreu um dano. "Por isso, se o consumidor
for comprar um carro de outra pessoa, por exemplo, o ideal é que compre de
alguém que conhece ou leve junto uma pessoa que entende muito de carros",
declara Berthe. O consumidor também não tem direito de reclamar se a loja se
recusa a aceitar um cheque como forma de pagamento, diz Marli Sampaio.
"Não existe lei obrigando o lojista a aceitar cheque. Mas é necessário
colocar uma placa informando isso ao consumidor, em lugar visível, de modo que
o consumidor saiba da restrição antes de fazer sua compra", diz a
presidente da SOS Consumidor. A loja não pode, porém, discriminar situações em
que o cheque pode ser aceito. Se ela aceitar essa forma de pagamento, não pode
determinar valor mínimo de compra, por exemplo.